terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Harold Bloom e sua "Terapia através de Romances"

Solitário, azedo e irônico:
assim é o leitor que busca
auto-ajuda em romances, para Bloom




Em “Como e porque ler”, pela Ed. Objetiva, (o título é um bocado pretensioso, não acham?) o famoso e polêmico crítico literário Harold Bloom traça uma teoria pela qual toda Literatura de qualidade é uma forma de auto-ajuda pois promove uma “terapia pela narrativa” baseada em três princípios: 1) amenizar a solidão, 2) ensinar algo sobre a vida e 3) promover Sabedoria por meio do refinamento da ironia do leitor.


Amenizar a Solidão


Logo na introdução Bloom define a prática da leitura voluntária de romances como algo que serve para “amenizar o sofrimento da solidão”. Diz ainda que os personagens dos romances se tornam uma espécie de amigos imaginários do leitor e que essa é uma forma de menos arriscada de conhecer pessoas. O prazer da leitura não é um prazer: é um alívio da dor, pois serviria para nos tirar do “estado doloroso de inércia sombria do coração”.

Ensinar algo da vida

Cada romance, para ser de fato Literatura de qualidade, ensina algo universal sobre a condição humana. Partindo dessa tese Bloom afirma que ao nos identificarmos com os personagens dessas narrativas sofremos e aprendemos junto com eles. (Um caso especial de aprendizagem vicária). Ele chega a afirmar que ao aprender com a experiência dos personagens não precisamos nós mesmos sofrer para aprender (ou seja, podemos abrir mão de ter experiências de vida).

Sabedoria por meio da ironia

Desenvolvendo sua tese sobre a aprendizagem o crítico literário afirma ainda que a leitura ensina e refina uma habilidade fundamental para o homem: a ironia. Bloom empresta esse conceito de Kierkegaard (filósofoso existencialista dinamarquês), para quem ironia é a arte de dizer uma coisa profunda falando algo superficial que parece não ter nada a ver com ela. Ou seja, cada romance ensina importantes lições de vida para o leitor a medida que este se torna mais irônico e passa a conseguir enxergar a verdade nas entrelinhas. Quando comenta sobre Proust, por exemplo, o crítico diz que esse é carregado de um “fascinante azedume”.

A sabedoria, em Bloom, está muito associada ao sentido clássico da Tragédia Grega: o sofrimento que deve ser aceito e usuufruído para fins de aprendizagem. No final o autor ainda afirma que nos dias de hoje o conhecimento é abundante e acessível, mas apenas o leitor que aderir ao estilo clássico (e aos clássicos da Literatura, especialmente seu adorado Shakespeare) irá conseguir obter algo além do conhecimento: a Sabedoria (conforme o Humanismo Clássico).

Que dizer de tudo isso?


Antes de mais nada, que Bloom não está falando de biblioterapia propriamente dita (que é uma prática mediada por um terapeuta onde a leitura ou escrita de uma narrativa é usada como procedimento clínico). Ele está, na verdade, incentivando a auto-ajuda. Para Bloom, a Literatura é imortal a medida que ela oferece a um leitor “em estado de inércia sombria” a capacidade de ajudar a si mesmo, mas não gerando prazer: suavizando a dor do existir.

Me parece (hipótese) que Bloom está falando tão somente de sua experiência pessoal com a leitura. O que ele diz parece estar carregado de amargura bem como prepotência (a começar pelo título do livro, lembram?).

Acredito que a leitura de um bom romance pode sim, eventualmente, amenizar a solidão de uma noite entediante, por exemplo. Mas não incentivo pessoas lerem para anestesiar suas dores: prefiro incentivar elas a deixarem de ser solitárias, superar seus problemas reais. Da mesma forma acredito que ler ensina muito sobre a vida, mas não permitiria que um amigo deixasse de ter uma vida social, por exemplo, para tão somente dialogar com amigos imaginários que brotam das páginas de livros.


Concluindo... Sou a favor da Literatura como arte, aprendizado e prazeres, mas não como auto-ajuda. Harold Bloom tem seus méritos quando critica livros, mas sua visão de leitor e leitura para mim é bem problemática.

Um comentário:

Andarilho disse...

Meio frouxa essa terapia do Bloom. Também acho um tanto quanto duvidoso que ele decrete que a única forma de alcançar essa sabedoria é através dos clássicos, como se outros estilos fossem escritos por macaquinhos idiotas (e olha que eu acho macacos bem inteligentes!).