quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

(ESPECIAL) Içami Tiba

Içami Tiba: senso comum pausterizado que vende!



Este post surgiu de uma contribuição muito especial de Luiz Graton, leitor deste blog, que enviou a seguinte informação estarrecedora para mim:



"Em pesquisa realizada em março de 2004, pelo IBOPE, entre os psicólogos do Conselho Federal de Psicologia, os entrevistados colocaram o Dr. Içami Tiba como terceiro autor de referência e admiração - o primeiro nacional.

1º- lugar: Sigmund Freud;

2º- lugar: Gustav Jung;

3º- lugar: Içami Tiba.

Seguem C. Rogers; Lacan; M. Klein; Winnicott e outros.Esses dados foram publicados no Jornal de Psicologia nº- 141, edição julho /setembro de 2004, do CRP-SP."


Primeiramente penso ser oportuno destacar que Içami Tiba é psiquiatra e não psicólogo (apesar de ter formação em psicodrama). Acho sintomático os psicólogos brasileiros não votarem em um psicólogo como autor de referência, mas em médicos (Freud, Jung e Tiba). Mas isso é assunto para outro post...


Vendo os livros da autoria de Içami Tiba na BU-UFSC pude notar que todos giram em torno da educação familiar aos jovens. Tiba se tornou o maior porta-voz brasileiro da tese de que a escola não deve ser a responsável pela educação moral: isso é responsabilidade da família no lar.


Partindo dessa tese central, Tiba desenvolve outros dois sub-temas da educação familiar em seus diversos livros: a) a disciplina na medida certa e b) o controle dos adolescentes, especialmente quanto ao uso de drogas.



Para ser sincero, eu que nunca li esse autor, até me empolguei com os temas, uma vez que eles realmente são muito oportunos no atual contexto social. A propósito, tive mesmo a impressão que Tiba fez uma pesquisa de marketing para saber quais os temas que venderiam mais...

Movido por curiosidade peguei "Quem Ama, Educa!" (um de seus maiores bestsellers, num exemplar de 37a edição pela Editora Gente) na BU-UFSC e levei para ler em casa.


Que decepção!


A primeira coisa que notei é que, pela linguagem, o livro parece ter sido escrito para crianças de cinco a dez anos. Ainda sobre a forma, há uma total falta de referências bibliográficas e o livro todo é escrito como um ensaio livre. Tiba simplesmente sentou-se na frente de seu PC e começou a digitar suas idéias (psicólogos andam com preguiça de ler textos densos, pelo visto).

A primeira parte do livro é dedicada a explicar as diferenças entre homens e mulheres, pais e mães. Removi alguns trechos hilários:

"A mulher vai pensando enquanto fala. O homem pensa antes de falar" (Umas amigas minhas, feministas, ficaram loucas para encontrar Içami Tiba depois dessa!)

"Numa refeição em casa, se o filho não quer comer, "Que não coma", pensa o pai. A mãe faz de tudo para alimentá-lo com carinho" (Ou seja: "Homens, tudo bem vocês serem grosseirões com seus filhos. É da natureza de vocês!")

"O marido é na verdade um filho temporão da esposa" (Claro, Tiba... Afinal macho que é macho é imaturo, boboca e deixa cueca suja no box).

"O pai ou a mãe nunca se transforma biologicamente no progenitor do sexo oposto" (Ah, ainda bem que ele me avisou!)

"Nosso comportamento sexual tem bases biopsicossocioantropológicas" (Caramba! Será que ele consegue dizer essa palavra três vezes bem rápido numa conferência?)

O livro prossegue com uma tipologia bizonha dos comportamentos, classificados em três classes: vegetal (ser passivo), animal (ser agressivo) e humano (disciplinado e afetuoso). Ok, Tiba simplesmente inventou essa tipologia, como uma espécie de parábola. Aliás, o livro está abarrotado de metáforas parecidas. Ele não sabe que só se usa muitas metáforas quando o público-alvo é completamente ignorante? (Ops, acho que ele sabe sim...)

A partir daí o livro vira uma seqüência de perguntas-e-respostas, no estilo daquelas colunas de auto-ajuda de revistas semanárias. Todas as respostas, claro, escritas com linguagem para criança, sem referências e repletas de opiniões particulares e cheias de preconceitos (especialmente sexistas).

Vale destacar... Em uma das perguntas, sobre videogames e violência, Tiba responde contando uma história de dar medo, onde um garoto e seus comparsas ensaiavam o seqüestro da namorada em um videogame... Ora, ora, ora. Eu, que atuo na área de games há 5 anos, nunca ouvi falar de um game em que fosse possível isso! Ademais, a história, que tem cara de notícia de jornal de segunda categoria, não tem referência bibliográfica alguma. Pode muito bem ser uma lenda urbana, ou pura invencionice da cabeça criativa de Içami Tiba!

Concluindo...
O que me parece é que Içami Tiba faz sucesso porque fala (mal) coisas óbvias sobre problemas atuais, baseado em achismos. Só conseguiu a projeção atual porque fez uso da indústria da auto-ajuda. Saber que Içami Tiba é a grande referência para os psicólogos brasileiros e que ganha fortunas dando conferências sobre educação me entristeceu em relação a essa classe profissional!

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

"Inteligência Multifocal"

A síntese de todas as besteiras anti-científicas!




É sério. Nunca li tanta bobagem junta em tão poucas páginas. Peguei esse livro na Biblioteca da UFSC e levei pra casa, e não pude ler senão com um balde ao lado para emergências.
Trata-se da "obra prima" de Augusto Cury. O livro que ele tentou emplacar como dissertação de Mestrado e foi (por algum motivo) rejeitado em inúmeros universidades. "Inteligência Multifocal" é a base de sua teoria, da qual saiu todos os seus inúmeros livros (já comentados nesta comunidade no post Especial sobre Augusto Cury).


Não resisti a tentação e fui beber a água (de esgoto) direto da fonte.
Pois bem... O que dizer do livro "Inteligência Multifocal"?

Para começar, a introdução do livro, na qual ele explica como sua revolucionária teoria foi criada, já é regorgitante. Cury diz mega-abobrinhas já nas primeiras págincas. Diz, por exemplo, que sua teoria é única, original, comparável a dos grandes pensadores, como Freud, Jung, Platão, etc (Absoluta arrogância!). Quando explica como chegou a essa teoria, diz que foi tendo suas idéias particulares, como livre pensador e fora do "cárcere da Academia". Ele chega a dizer que simplesmente parava, pensava e anotava suas idéias, se recusando a saber o que outros pesquisadores do presente e do passado disseram sobre aqueles temas para não ser contaminado. Esse é o método de pesquisa de Cury...



Sobre a teoria em si, trata-se do mais puro mentalismo totalmente clonado da obra de Freud. Cury assume que é um psicodinâmico (ué, ele não era 100% original?) e o tempo inteiro fala de inconsciente, energia psíquica, mente, etc. Contudo, ele mistura essa percepção superficial da psicanálise com cognitivismo, falando de estruturas da mente e do processamento de informação no cérebro. Em resumo: sua teoria, do ponto de vista epistemológico, é um misto confuso e mal arranjado de psicanálise e cognitivismo, com ênfase em aspectos psicossociais.
OBS: O nome "Multifocal" vem do fato que ela explica diversos aspectos do EU humano (que Cury diz serem 32, mas não oferece a lista em nenhuma parte do livro).


Basicamente a "Inteligência Multifocal" de Cury determina que


1) a inteligência, a mente, a personalidade, a consciência, o EU, self, etc, são uma mesma coisa. Essa entidade vive dentro de nós (na perspectiva mentalista) como um eu-gerador, e é formado pelos 3 "mordomos da mente": a memória, os pensamentos presentes e o fluxo da energia psíquica (???).


2) O EU surge ao se apropriar da da memória para gerenciar os pensamentos, que podem ser dialético, antidialéticos, tridimensionais, essenciais, inconscientes, etc (e que aliás são mais ou menos a mesma coisa que emoções e sentimentos).


3) Esse EU-interior se exterioriza nas relações psicossociais com outros EUs (pessoas) através de "psicoadaptação" e evolução pelo exercício da "cidadania"(???); mas é fundamental que ele interiorize o mundo através da criatividade, da poesia, da arte de refletir, da arte de questionar, etc.


4) Se o EU-interior não se interiorizar corretamente surgem as "doenças psicossociais", como por exemplo o "Mal do Logos Estéril" (hahahahahha!), pelo qual a pessoa aprende sem prazer (!) e também a temível "Sindrome da Exteriorização Existencial" (hahahahah!), que consiste na incapacidade de se interiorizar (?) através da reflexão e da introspecção. OBS: Realmente a psicopatologia de Augusto Cury tem nomes bem criativos para as doenças.


5) A medida que vive de forma saudável, o EU-interior ganha mais consciência existencial, se tornando pleno e livre de doenças bem como transformando a pessoa num livre pensandor, não amordaçado pelas prisões da Modernidade.


6) A Inteligência Multifocal é a teoria que mais chances tem de tirar os pensadores do marasmo intelectual que estão nem começo de século XXI e levar a humanidade a um salto qualitativo de evolução (HAHAHAHAHHAHH!)


Ufa!

Não acredito que consegui ler aquilo. E nem acredito que consegui resumir esse livro aqui. Para mim "Inteligência Multifocal" não passa de um pastiche de teorias muito mal arranjado. O livro também é mal escrito: o texto é confuso e se arrasta (e olha que foi escrito ao longo de 17 anos pelo autor!).



Sem dúvida, o PIOR livro que já li sobre Psicologia e afins. Estou convencido que Augusto Cury é o maior charlatão do Brasil em se tratando de suposto profissional de saúde humana!


Caro leitor, foi um trabalho hercúleo da minha parte criar este post. Com licença, vou pegar meu baldinho de vômito...


segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

matéria sobre Auto-Ajuda na revista Psique


Saiu na Revista Psique #23, de dezembro de 2007, uma interessante matéria sobre auto-ajuda.

Não pude deixar de comentar aqui...

Ana Maria Serra, uma representante do Conselho Federal de Psicologia dá o parecer oficial da instituição sobre o tema: "É um tipo de Literatura, um saber não-sistematizado, sem fundamentação científica e que beira o pensamento mágico".

A matéria segue falando de como os livros de auto-ajuda são romances baseados nas experiências particulares dos autores e que propõem fórmulas não-comprovadas para solucionar problemas não corretamente abordados. Podem até ajudar, mas dificilmente, e quando muito, ajudar pouco.

Vale a pena conferir!